segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Rotina dos autores de telenovelas é dura e muito bem-paga


Quando seus folhetins estão no ar, a vida dos autores de TV se transforma em uma novela à parte. Muitos dedicam de oito a treze horas do dia para desenvolver suas histórias, rotina que inclui os finais de semana. Cada capítulo tem de 25 a 45 páginas e, ao final de uma trama, mais de oito mil páginas podem ter sido escritas.

Para tanta labuta a recompensa costuma ser alta. Estima-se que um autor de novela da Globo chegue a faturar três milhões de reais por ano quando sua novela está no ar, valor que inclui inserção de merchandising. Mas é uma maratona que faz qualquer atividade corriqueira do dia-a-dia cair no esquecimento.

"Almoço em 15 minutos, só atendo o telefone se for o Dennis Carvalho e às vezes percebo que estou há uma hora e meia desesperado para ir ao banheiro", relata Antonio Calmon, que escreve Três Irmãs.

Para enfrentar o trabalho árduo, a maioria dos autores conta hoje com colaboradores para desenvolver suas novelas. Cada um estabelece a divisão das tarefas de um jeito, às vezes de acordo com os núcleos ou com as afinidades por determinados temas.

"Eu e a Alessandra Poggi fazemos as escaletas, que são os resumos de todas as cenas de um capítulo. Os outros colaboradores encaminham as histórias que contamos a cada semana", explica a autora de Malhação Patrícia Moretzsohn, que discute todos os núcleos com toda a equipe.

Método diferente do adotado por Calmon. "Escrevo todas as cenas de humor e instauro personagens novos. Mas é a Adriana Chevalier quem cuida do núcleo dos surfistas, pois conhece as gírias por ter um filho que pega onda", justifica o autor da novela das sete da Globo.

Na Record, Cristianne Fridmann chega a sonhar com personagens e histórias de sua Chamas da Vida. "O pior é quando tenho pesadelos", brinca a autora. Ela conta com cinco colaboradores e foi mudando o seu método de trabalho durante a novela. Antes dividia a feitura dos núcleos entre todos e fazia a redação final.

De uns tempos para cá, escreve todos os capítulos sozinha, enquanto eles dão sugestões e ficam responsáveis pela escaleta. "Era pouco prazeroso fazer a escaleta e parece que me livrei de um elefante pisando no meu estômago. Encontrei o método de trabalho que me realiza", exagera Cristianne.

Camilo Pelegrini, um de seus colaboradores, diz que não há discussão na hora de desenvolver os rumos das tramas. "A base da história já vem bem planejada e clara por parte da Cristianne. Meu papel como colaborador é dar idéias", simplifica Camilo.

Mesmo em uma novela com mais ação do que diálogos, caso de Mutantes - Caminhos do Coração, da Record, a carga de trabalho do autor não diminui. "Muita ação até aumenta o meu trabalho, pois preciso roteirizar as cenas, prever quem está lutando com quem, quem está fazendo o quê", exemplifica Tiago Santiago, responsável pela trama.

Trabalho por trabalho, Glória Perez prefere escrever suas novelas completamente sozinha, o que é uma exceção atualmente. Caminho das Índias, que começa nesta segunda na Globo, estréia com 24 capítulos já prontos.

A autora escreve 32 páginas por dia. "Juro que é mais fácil trabalhar sozinha. Eu me policio. Se quero sair à noite, trabalho de dia, e vice-versa", resume Glória, cotada como a autora que tem o salário mais alto da emissora, devido às altas audiências de seus folhetins.

A tarefa é árdua, mas todos esses autores já foram colaboradores um dia. E eles não ousam reclamar do prazer que têm atualmente em poder contar as histórias que querem, como bem entendem, para milhares de telespectadores em todo o país.

"Como colaborador eu tinha mais tempo livre e menos responsabilidade. Mas prefiro mil vezes as grandes dificuldades, para ter autonomia sobre os rumos da trama", compara Tiago Santiago, sem se esquecer que o retorno financeiro também aumenta quando se assina uma novela.

Na Record, quanto mais suas novelas sobem na audiência, mais ele ganha. Na Globo, Tiago nunca tinha feito uma novela sozinho.


Nasce uma autora
Íris Abravanel tinha vontade de escrever uma novela desde que trabalhava com Walcyr Carrasco na revista Contigo, na década de 90. Mas só em 2008, e depois de mostrar que seria capaz de escrever uma sinopse, ela conseguiu a aprovação do marido Silvio Santos.

Íris apresentou uma história ao diretor de dramaturgia do SBT, Davi Grimberg e ao supervisor de texto Yves Dumont. Tudo se passava em São Paulo, mais propriamente no Palácio do Governo, e a cidade enfrentaria uma enchente.

"Eles disseram que iam criar condições de contar essa história em nossa cidade cenográfica. Aprendi como sair de algo grandioso e colocar tudo dentro de nossa caixinha de possibilidade. Surgiu a fictícia Tirânia", relembra Íris sobre o início de sua empreitada.

A autora contou com colaboradores para escrever a novela do SBT, que já foi toda gravada. Uma de suas ajudantes, inclusive, é uma professora de informática que a ajudou a resolver um problema em sua impressora. "Ela estava sem fazer nada e acabou escrevendo uns textos para mim. De repente estava encarregada de desenvolver a história do núcleo principal", confessa Íris, sem constrangimento.

Mesmo com ajudantes, Íris também não esconde as falhas que cometeu pelo caminho. "Inclui um cachorro em um dos núcleos. Mas depois me esqueci e ele sumiu. Quando me lembrei, escrevi que alguém em cena fazia carinho no cachorro para ele reaparecer", destaca Íris, que desenvolveu o núcleo da academia sexual. "Peguei o cômico porque mesmo quando eu escrevia sério, todo mundo dava risada", afirma aos risos.


Instantâneas
# Uma das promessas de ano novo de Patrícia Moretzsohn foi ter uma rotina de trabalho menos intensa em 2009. "Mas acho difícil. A gente acaba se acostumando com a correria, e gostando", pondera a autora de Malhação.
# Glória Perez chegou a escrever Partido Alto com Aguinaldo Silva, em 1984. Mas os dois se desentenderam e ela nunca mais estabeleceu parcerias.
# Com exceção de Ângela Carneiro, já veterana, todo os colaboradores de Calmon em Três Irmãs são formados pela própria Globo.
# A primeira novela que Calmon escreveu foi em parceria com Walter Negrão. Top Model, de 1989, tinha muita praia e surfe, assim como Três Irmãs.



Crédito: Terra
Matheus Logan

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